sábado, 11 de junho de 2011

POST SCRIPTUM (HUBERTO ROHDEN)

Estas palavras do grande filósofo brasileiro que podem ser encontradas ao final do seu livro “Profanos e Iniciados”, convidam a um olhar sobre a dificuldade das pessoas em se transformar, em se alinhar com o movimento fluídico da vida, que é mudança, fluxo, conforme Simplicius de Cicilia formulou (Τα Πάντα ῥεῖ - ta panta rhei – tudo flui), a partir dos ensinamentos de Heráclito de Éfeso. Em consequência, Heráclito de Éfeso não é o filósofo do "tudo flui" mas do "tudo flui enquanto resultado da tensão contínua dos opostos em luta".

“Muitos dos leitores deste livro que tiveram a coragem de avançar até aqui, estarão escandalizados com as “heresias” que o autor apresentou. Para estes vou acrescentar umas palavrinhas de explicação e, quiça, de reconciliação.

Meus caros amigos “ortodoxos”. Eu não tenho intenção alguma, como, aliás, já frisei no prefácio, de lhes arrancar do coração uma “fé” sem a qual sua vida seria horrivelmente frígida e insuportável. Pelo contrário, recomendo-lhes sinceramente que conservem e cultivem sua “fé”, enquanto dela necessitarem para sua tranqüilidade e consolação interior. Esse apego ferrenho ao que apelidam sua “fé” é sinal certo de que dela necessitam ainda; que sem ela seriam infelizes, como que suspensos no vácuo, sem base sólida sob os pés. Ninguém deve abandonar uma idéia ou uma doutrina antes que o possa fazer com espontânea naturalidade e sem nenhuma dilaceração interior. Enquanto uma fruta está muito presa à haste, é sinal, geralmente, de que ainda não está madura. Só se deve abandonar uma idéia ou uma doutrina quando se pode fazê-lo sem nenhuma violência psíquica, sem nenhuma hemorragia moral, com espontânea facilidade e verdadeira alegria de espírito, porque isto é prova de que chegou o tempo da maturidade e que a alma está pronta para um novo passo, rumo ao reino de Deus.

Quando o bicho da seda chegou ao termo de sua vida de lagarta, enclausura-se num casulo de fios de seda, que tira da sua própria boca, não para ficar sempre nesse invólucro, mas para proteger o seu misterioso sono de crisálida contra possíveis inimigos externos, e, destarte, preparar tranquilamente o seguinte estágio da sua evolução. Seria insipiência não querer enclausurar-se no casulo protetor – e insipiência não menor seria não querer, a seu tempo, romper o sedoso invólucro a fim de atingir sua metamorfose final de borboleta alada.

Enquanto o leitor sentir a necessidade interna de repousar dentro do seu lindo casulo, tecido da substância da sua filosofia e teologia, não saia desse abrigo acolhedor. Não se esqueça, todavia, de que qualquer casulo de humana teologia e exegese, por mais lindo e sólido, não passa de um “meio”, e não um “fim” em si mesmo, e tem de ser usado tanto quanto servir para a consecução do fim supremo e último do homem, que é o pleno conhecimento, amor e posse do reino de Deus. Seja, pois, o leitor sincero consigo mesmo, tanto no “conservar” como no “abandonar” qualquer sistema de pensamento, de conformidade com o seu destino supremo. Não idolatre, não se enamore, não se agarre fanaticamente a nenhuma filosofia, teologia ou exegese. Deus é absoluto e definitivo, mas todos os nossos conhecimentos sobre Deus e seu reino são relativos e em constante evolução.

Não pense, pois, o caro leitor que eu lhe queira arrancar as muletas de que se serve para andar nos caminhos de Deus. Use suas muletas enquanto lhe forem necessárias nessa longa jornada – mas não se esqueça de que elas são um meio, e não um fim em si mesmas. Bem sei que é melhor andar de muletas do que ficar estendido à beira da estrada. Nada tenho contra suas muletas; tolero-as enquanto necessárias – estou interessado unicamente em ajudá-lo a adquirir saúde perfeita, em encher de vigor espiritual a sua alma. No dia e na hora em que meu ignoto amigo tiver adquirido essa saúde e esse vigor, não lhe darei ordem para jogar fora suas muletas – porque o amigo já as terá abandonado espontaneamente e correrá jubilosamente nos caminhos do reino de Deus.

No caso que o irmão em Cristo não possa ainda compreender o sentido desta linguagem simbólica, nem tenha a coragem e a humildade de aceitar o que lhe digo, não se irrite nem se revolte contra o autor deste livro – mas retire-se freqüentemente à intensa oração e abisme-se profundamente na comunhão com Deus...

E compreenderá...

Um comentário:

  1. sim..eu sempre mantenho a esperança de que alguém vai compreender..grata por nutrir minha esperança. Bjo!

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