terça-feira, 27 de março de 2012

MÁSCARAS E MASCARADOS III - SAÚDE SOCIAL

POR MÁRIO INGLESI

Outras máscaras preenchem o nosso cotidiano com seus propósitos explícitos e implícitos, através do emprego de tempos verbais para indicar sentidos múltiplos, como o da delicadeza, polidez, ironia, informalidade, em ordens diversas para anunciar para cada ocasião.
Nesse contexto, há ainda a máscara do “politicamente correto”, cujo uso permeia a obrigatoriedade, com vistas a dirimir mazelas e evitar preconceitos inscritos na linguagem do dia a dia. Tal máscara e seu uso tornaram-se apenas mais uma falácia. Não serve realmente a seus “bons” propósitos. Por exemplo, a substituição do termo “prostituta” por “profissional do sexo”, em nada muda a condenação que a sociedade impõe à atividade que essa pessoa realiza, pois, é a atividade e não o nome que provoca atitudes de condenação, conforme salientou, Roberto Leiser Baronas, dr. em Lingüística e Língua Portuguesa, em artigo publicado na revista Língua, (portuguesa), edição de fevereiro 2011. Há, também, um tipo de máscara usada para impedir a identificação e preservar o anonimato. É o que ocorria muito em tempos idos com as cartas anônimas despejando segredos ou confidências que influíam de modo perverso na vida do indiciado pelo missivista e, hoje, usada toda vez que se deseja influir destrutivamente na vida de um desafeto, por egoísmo, inveja, birra ou pura maldade, ou brincadeira de mal gosto através do “anonimato”, cuja modalidade, hoje, campeia em larga escala na internet e nas redes sociais, escondendo quem realmente somos e o que pensamos, talvez por pejo ou para não nos comprometermos naquilo que dizemos e opinamos. Mas, contrariamente, também usamos o anonimato para nos opor à exposição, à identificação, principalmente hoje, quando a exposição e identificação são procedimentos usualmente banais e corriqueiros e, já de má reputação, dada a sua frequência e inocuidade.

O anonimato atinge o universo dos profissionais especializados que alugam sua escrita e ideias em favor de terceiros, os “ghost writters”, os denominados escritores fantasmas, objeto do romance Budapeste, de Chico Buarque de Holanda. Com isso, a máscara atinge o plano físico e das ideias para crédito de autoria a outrem: os autobiografados, os ensaístas ou os candidatos a teses de mestrado ou doutorado.
De modo diferente, mas também com a máscara do anonimato em favor da divulgação, promoção e propaganda, os “covers” musicais apelam para o travestimento geral e integral de grandes ídolos, da musica pop ou não, sem nenhum constrangimento, mas com a plena satisfação de estarem promovendo os seus ídolos e suas performances musicais.
Como se nota, o uso da máscara perpassa toda nossa vida, de um modo ou de outro, em situações múltiplas, as mais inusitadas e as mais diversas, a nosso bel prazer ou de acordo com cada circunstância que se nos apresenta.  Uma reflexão sobre elas só quando no fundo de nós mesmos, na mais íntima solidão de nossa loucura, buscamos aos gritos os porquês do uso de tais máscaras.
A máscara mais em voga e conhecida hoje em dia, e, mais bufa da comédia pública, envolve altos e médios escalões da República. Ela prima por sua inusitada mutação constante, sempre de acordo com as situações, mas plena de efusivas maquiagens e salamaleques palavrosos que acompanham, seus portadores, como: Vossa Excelência, Excelentíssimo, no afã de marcar a honra do mandato, do respectivo partido, bem como as tradições, a pátria e seu eleitorado, numa carreira intrincada, mas cheia de brilharecos que os açodam convenientemente com mesuras e teatralidade sem fim, o mascarar sem limites.
Tal máscara é trançada com finos fios de hipocrisia, de inverdades, de indignidade, fleugma patriótica mistificadora e mais que tudo isso, ornadas de miçangas e lantejoulas coloridas, fazem de seus portadores verdadeiros mistificadores da pátria amada idolatrada, causadores de grandes constrangimentos ou de não poucas gargalhadas, quando de suas performances inusitadas por seus usuários no Gran Circo de Pindorama.
A única particularidade dessa máscara advém do fato de ela não precisar de tratamentos ou cirurgias médicas para removê-las ou curá-las de seus malefícios em favor dos seus usuários. Pois qualquer providência depende unicamente de nós, seus espectadores, na hora de escolhê-los a cargos eletivos e, de acompanhar seus desempenhos durante a atuação de seus mandatos. Caso contrário, só teremos “ilusões perdidas e sonhos vendidos, como bem proclamou Cazuza (1958-1990) na letra de “Ideologia”:

Meu partido
É um coração partido
E as ilusões
Estão todas perdidas
Os meus sonhos
Foram todos vendidos
Tão barato
Que eu nem acredito
Ah! eu nem acredito

Pois aquele garoto
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Agora assiste a tudo
Em cima do muro
Em cima do muro…

Meus heróis
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia! Pra viver…

Portanto, é preciso muito cuidado ao lidar com tal máscara, pois há sempre a possibilidade de travesti-la em todos os demais personagens de idêntica função. Isso acarretará um descrédito tal, que poderá alçar qualquer político ou não a apresentar-se como salvador da Pátria e insuflar a necessidade de leis de exceção, e com elas adeus o Estado de direito, as liberdades de expressão, e de pensamento. Adeus à democracia. É o alçar ao grau supremo, a máscara ditatorial, com sua feição horrenda, tecida com fios rotos do nacionalismo, da demagogia e do populismo.
Como se percebe, a máscara, além de simples adereço, reflete também sentimentos, atitudes, e modalidades infinitas da síntese humana e sua passagem pelo planeta Terra.
Começa logo ao nascer. A criança, com seu rosto avermelhado e ainda com as sujidades do parto, faz o seu primeiro choro, com as palmadas que logo recebe ao vir ao mundo.
Depois, a máscara se torna sua identidade e com o choro intermitente, por alimento, sua comunicação imediata e única. Com o crescimento, vêm as máscaras das birras, da chantagem emocional e por aí vai pelos primeiros tempos, do engatinhar até os primeiros passos titubeantes.

 



Continua...
 

domingo, 25 de março de 2012

QUESTÃO ETERNA



Às vezes percebo
do cosmo o mistério profundo:
de onde vem a energia
que planta vida e poesia
na superfície do mundo?
Resposta não recebo
Afasto o telúrico véu
e cismo num segundo:
sou um elo fecundo
entre a terra e o céu
Dulce Moron (1987)

domingo, 18 de março de 2012

A MENTE MENTE I


POR:

RODRIGO YACUBIAN FERNANDES;

RICARDO JOSÉ DE ALMEIDA LEME

"Isto não é um cachimbo"



Ainda existe muita controvérsia em relação à mente e seu fundamento, sendo polarizada a questão sobre qual é sua origem. Para os cientistas embasados no materialismo (fenomenalistas), ela surge como epifenômeno de reações químicas e elétricas que ocorrem no arcabouço estrutural do sistema nervoso central (células neurais e células gliais). Para o grupo de cientistas realistas (baseados no realismo dos não observáveis), uma explicação comum é ver a mente como um corpo em formação ao redor do corpo físico, e o cérebro com toda sua complexidade estrutural e funcional como “antena” decodificadora da mente.

Construindo mentes e pensares - A ciência é neutra em seus julgamentos?
 
Uma pena a remoção do vídeo acima da rede; o mesmo oferecia um pensar crítico muito raro hoje em dia. Na rede tem um monte de material com o mesmo nome, um monte de falação, mas o conteúdo é muito pobre em relação ao que o vídeo original mostrava. Seu endereço antigo era:



         Neste caso, fica aqui algo, menos, mas que ainda vale no sentido de impulsionar o pensamento na direção de algo vivo:


         Anticientífica é apenas a atitude de negar possibilidades, baseando-se em argumentação não epistêmica (ex: ego, auto-afirmação, defesa de interesse de grupos, verbas condicionadas ao modo de pensar os modelos, necessidade de impor a sua verdade em relação à do outro por convicções pessoais e assim por diante). Na obra: “A Estrutura das Revoluções Científicas”, o físico Thomas Kuhn ajuda a ver como modelos científicos insustentáveis são perpetuados a despeito de sua inconsistência teórica, assim como os mesmos se transformam no fluxo do tempo.

Thomas Kuhn
Se para alguns a matemática é uma religião e matéria de fé, sendo o não observável tido como não existente, irrelevante ou não considerável; para outros, o não observável é campo fértil, a partir do qual explicações fundamentais podem emergir e auxiliar na compreensão e mesmo na descrição dos fenômenos observados no mundo físico (physis é natureza). Natureza que naturou no latim, afastando-se da fonte, mas que no grego preserva sua proximidade com a luz, conforme vemos na proximidade de physis com phos em Houaiss: do gr. phôs,phótós 'luz'; o antepositivo fos- ficou algo especializado para a área da nomenclatura química, enquanto fot(o)- se irradiou sobretudo para a física, a medicina etc.

Calvin, Matemática e Religião
 
Nessa mesma direção a consciência pode ser vista à semelhança da mente, ou mesmo como um campo de informação em nuvem que a envolve, como na internet, em que o cérebro seria o hardware para a mente (software) que lendo a partir da consciência (nuvem de informação) permite que a pessoa desenhe sua vida no plano físico. Ao universo do mundo calculado (realidade física mineral), se somam outros universos que se aprofundam na direção da imaginação (não aquela que é delírio, mas a que pensa a partir de imagens ou que coloca imagens mentais em ação), da inspiração e da intuição, órgãos em desenvolvimento no ser humano em busca de sentido. O pensar consciente é resultado do alinhamento entre imaginação, inspiração e intuição, veículos de acesso ao essencial do Ser. Para tal, são importantes as práticas da concentração, da meditação e da contemplação, ferramentas fundamentais para uma vida plena, saudável e consciente.

Alinhamento e fluidez entre imaginação, inspiração e intuição

Um exemplo que flui em paralelo com o cientificismo materialista é encontrado nos ensinamentos de Yogi Bhajan, Mestre responsável pela abertura e disseminação da Kundalini Yoga pelo mundo, segundo o qual a mente pode ser classificada como possuidora de três qualidades principais:
  1. Mente negativa (ou protetora). É a mente da sobrevivência. Reativa, investiga o perigo em potencial e proteje. Como é sensível à dor, procura proteger das forças que podem destruir ou desorganizar.
  2. Mente positiva (ou expansiva). É construtiva, ativa e assume riscos. Incentiva a realização de vontades e possibilidades. Procura o prazer.
  3. Mente neutra (ou meditativa). É a que observa as ações. Avalia, sem apegos as ações tanto da mente positiva, quanto da negativa.

Cada pensamento é filtrado através das três mentes, que estão desenvolvidas de forma diferente em cada indivíduo. Todas as mentes têm seu papel e importância, porém quando há situações de desequilíbrio podemos experimentar medos, anseios, fobias e outras situações que a nossa mente negativa pode nos propiciar, assim como podemos experimentar riscos indesejáveis por conta de uma mente positiva em atividade desordenada.

M. Escher

Nossas mentes não podem ser confrontadas. Elas podem ser treinadas. Uma ferramenta muito útil e saudável é a prática da meditação. No processo meditativo, podemos aprender a observar a atividade mental e discernir e conhecer as propriedades de cada faceta da mente. No cotidiano ocidental, costuma-se dizer que meditar é parar de pensar. Convenhamos que parar de pensar é uma tarefa muito difícil. Prefiro dizer que meditar é observar a atividade da mente, conhecendo-a cada vez melhor e aprendendo a observá-la. Durante práticas de meditação, os pensamentos surgem e assim é esperado. Se não desenvolvermos o pensamento, dando a ele força, podemos treinar nossa mente. Ou seja, nossa mente pode ser treinada e não confrontada. Com a prática disciplinada da meditação, podemos fortalecer a mente neutra, facilitando conhecermos e observarmos com mais clareza as atividades das três facetas da mente, facilitando o contato com nosso ser superior, que reside em nós mesmos (e não lá fora em algum lugar) e equilibrando as facetas da mente, de modo que a negativa nos tire do perigo (quando real) e a positiva fortaleça nossa vontade de construir e realizar, se essa vontade for alinhada com nosso ser superior. Esse alinhamento torna-se possível através da mente neutra.



 Ser superior pode ser definido como a essência infinita que reside em nós mesmos e que pode nos conectar com a consciência universal. Quando meditamos podemos diminuir as interferências do cotidiano e do mundo externo, facilitando essa conexão.